sexta-feira, dezembro 05, 2008

Anos Incríveis



“Crescer acontece de repente, como uma batida do coração. Num dia você é uma criança, no outro, esse garoto não existe mais. Mas as memórias da infância permanecerão com você na longa jornada” [Kevin Arnold lembrando os anos que marcaram demais sua vida]
Nunca antes a TV conseguira retratar tão bem - com beleza, paixão, poesia, força e verdade - os melhores anos de nossas vidas: a travessia dos 11 para os 16 anos. É essa a proeza do seriado Anos Incríveis [Wonder Years], que acompanhou por seis anos [em tempo real] a vida do garotinho e depois adolescente, Kevin Arnold, sua família, amigos, professores e todo o momento histórico da época [a virada dos anos 60 para os 70].
Nunca existirá outro seriado como esse, porque os valores cultuados naqueles anos dourados parecem hoje sonhos e ideais distantes, nesse mundo cada vez mais desumano e violento. Nesse mundo em que “o futuro das nações”, os adolescentes com poder [quem têm uma boa formação educacional, cultural e condições econômicas], preferiram aderir ao sistema. Preferiram o consumismo, a alienação e a apatia aos protestos e sonhos de um mundo melhor que defendiam os jovens dos anos 70.
Anos mágicos e conturbados, fartos em esperança, alegria ou dor; guerra e paz; assim foi o período entre 1968 e 1973, nos anos em que Kevin Arnold, transformou-se de uma criança que ainda não descobrira o encanto da primeira vez [primeiro beijo e namorada] em um jovem já entediado de um trabalho rotineiro, que deseja chutar o balde e cair na estrada.
Enquanto Kevin cresce, vamos assistindo às suas descobertas: o amor que nasce tão cedo, mas forte e puro por Winnie Cooper; a amizade leal, com jeito de eterna, com Paul; o difícil relacionamento com os irmãos mais velhos [o alienado Wayne e a revolucionária Karen] e sua complexa relação, farta em desejos de se libertar mas também explodindo de carinho e atenção, com os pais. E nem falei das pequenas grandes batalhas, glórias e derrotas - todas valiosas lições - vividas na escola; na festa em que quase destruiu sua casa, no romance de verão com a menina do lago, na saudade do fiel companheiro por tantos anos, o cachorrinho beagle Buster...
Além de retratar com sensibilidade os tesouros e problemas dos anos-ritos de passagem de Kevin Arnold [parecidos demais com as experiências de todos os que tiveram o privilégio de uma infância inesquecível], Anos Incríveis é ainda mais mágico por cada episódio ser narrado por um Kevin já adulto. Então ele faz reflexões sobre cada experiência que viveu quando garoto. Sim, há um certo saudosismo triste, pois percebe muitas vezes que alguns momentos e oportunidades não voltarão jamais. No entanto, o Kevin já crescido e pai de família mostra que seu coração será sempre uma grande colcha, tecida com cada pequena beleza, sonho tornado realidade e lição daqueles anos maravilhosos.
Sopro de esperança. O mundo está cada vez mais longe dos ideais de paz, amor e compreensão defendidos pelos jovens da época de Kevin. Quanta paixão, amor e afeto eles exibiam em tantos momentos marcantes, como nos protestos contra a Guerra do Vietnam, nos festivais de música da contracultura dos hippies, ou no tempo maior que se passavam junto da família e amigos [ainda não existia o videogame, a internet ou a overdose de cursos para ocupar a molecada]!
Mas cada vez que exibo no colégio um episódio desse seriado, e vejo a atenção, sorriso e até algumas lágrimas disfarçadas [por que os meninos e meninas de hoje precisam esconder as lágrimas, tão doces e puras?] de meus alunos, volto a acreditar que um dia esses anos voltarão de novo...
Porque “eu me lembro de um lugar… de uma cidade, de uma casa como tantas outras… um quarteirão, como tantos outros... uma rua, como tantas outras. E uma coisa permanece a mesma… depois de todos esses anos, eu ainda olho para trás... e vejo que foram anos incríveis...”

P.S. Dedicado aos meus eternos alunos e amigos, que um dia se emocionaram com esse seriado, e para a menina da praça.
(30/03/2004)

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