domingo, agosto 01, 2010

Born to Run

(Quando viver é partir)

Bruce canta toda a paixão, todos os sonhos e o maior amor do mundo, aquele que faz um cara precisar de uma mulher pra fugir dessa armadilha do cotidiano ou da pressão demais da cidade em que (sobre)vive.
I wanna know if your love is wild
Baby, I wanna know if love is real
“Eu quero saber se o amor é selvagem, eu quero saber se o amor é real.” Isso só será possível se nossa cara metade nos acompanhar, ou nem precisa ser já a amada, basta ser uma mulher que tenha a loucura tão sã de nos acompanhar, cheia de coragem e paixão numa corrida para algum lugar e algo melhor. Tudo isso cantado, mais que isso, entoado, por essa alma incendiária e apaixonada, pelo Grande Chefe das Canções e Histórias Tão Belas, as músicas e as narrativas que vêm da alma, que vêm do homem que ainda parece, depois de tantos anos, o mesmo jovem do subúrbio de New Jersey, vizinha a Nova York, cheio de fúria feliz pela vida, Bruce Springsteen.
We gotta get out while we're young
'Cause tramps like us, baby we were born to run
“Precisamos cair fora enquanto somos jovens, porque vagabundos como nós nascemos para correr.” Será que só quando se é jovem tem-se a coragem necessária para ir embora? Qual é a idade da juventude? Existe uma idade para se desistir dos sonhos? Quantas pessoas já não jovens, segundo a sociedade, não tiveram essa coragem? Quantos jovens acomodados existem por aí sem a audácia e fibra de pessoas muito mais velhas? Quantos velhos não estão por aí, na fundamental experiência das ruas e viagens, enquanto muitos jovens trancam-se em suas gaiolas tecnológicas virtuais? Quantos jovens, vagando anestesiados, cegos e surdos pelas ruas – com mp3s, iPods, celulares com som, net e TV - ainda veem, escutam e sentem o que está lá fora? Algo chamado vida.
Mas ainda há esperança para os que precisam de um empurrãozinho para escapar, ainda há alguns fugitivos para salvar as tantas Wendys da canção, presas em uma vida opaca. Há ainda há por aí esse cara que Bruce canta:
Wendy, let me in, I wanna be your friend
I wanna guard your dreams and visions
“Wendy, me deixe entrar, eu quero ser seu amigo, eu quero guardar seus sonhos e visões.” E que sentimento pode ser maior desse cara que gosta tanto de uma garota que quer ser também amigo dela e proteger os sonhos dela? Quantos de nós temos os ouvidos e amor necessário para pensarmos de verdade em quem gostamos e ajudarmos essa pessoa a realizar seus sonhos? Pé na estrada não é só ligar o motor, apanhar sua garota e fugir, é se preocupar com ela e junto dela lutar por tudo o que é possível. Together we could break this trap. “Juntos podemos romper essa armadilha.” Juntos. Porque para Bruce o amor será sempre Nós.
Sim, Bruce tem a coragem de admitir que o fugitivo é um Cavaleiro, mas um cavaleiro com medo, por isso pede walk with me, venha comigo.
Pausa para o solo de sax, pausa viva, pois o sax é o carro acelerando, é a coragem em ação, é a estrada, é a tentativa de mudança.
Fim do solo, o Fugitivo e Wendy tentam ir embora, mas há algo na letra que nos faz ver que talvez não dê certo, I wanna die with you Wendy on the streets tonight
In an everlasting kiss.
“Quero morrer com você nas ruas esta noite em um beijo eterno”, canta Bruce, sabendo talvez que não é possível correr-fugir-encontrar. Talvez não haja gasolina suficiente, talvez não haja emprego, talvez não haja a louca coragem para partir. Volta o sax, tentemos de novo, acelera, pisa fundo, deixa a poeira pra trás como se a realidade fosse uma nuvem de pó ou esse pó seja o sonho voando a nossa frente.
Volta então a canção
Highway's jammed with broken heroes
On a last-chance power drive
Everybody's out on the road tonight but
There's no place left to hide.
“A estrada está cheia de heróis arrebentados numa última jornada, numa última chance, todo mundo está lá fora, não há onde se esconder.” Talvez não seja possível correr, mas Together Wendy we can live with the sadness, “juntos nós vamos viver essa loucura, Wendy”. E vêm então os versos mais belos da canção. Os versos de um coração sincero que pede confiança, um “acredite em mim”:
Someday girl I don't know when
We're gonna get to that place where really wanna go
“Algum dia, menina, eu não sei quando, nós vamos chegar naquele lugar que queríamos realmente encontrar.”
Tramps like us, baby, we are born to run, “Vagabundos como nós, querida, nós nascemos para correr.” Vagabundos é a tradução exata de Tramps, mas Bruce deve querer dizer Viajantes, Gente que procura, de verdade, viver.
PS – Poucos lugares do mundo representam tão bem a beleza, arte e chama de viver como a cidade em que Bruce deu essa apresentação, Barcelona, no coração da incendiária Catalunha.

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