sábado, setembro 18, 2010

A Companhia Fundamental


Por que sempre lembramos de pessoas especiais quando os olhos marejam e a garganta embrulha ao encararmos cenas difíceis em “simples” filmes? Por que a dor dos personagens ou a alegria máxima deles desviam nosso olhar interior para as pessoas que nos marcaram? Será que essas pessoas  sabem que elas nos marcaram de alguma forma e que em momentos críticos lembramos, muito, delas? Mas por que sentimos uma enorme vontade, até necessidade, de procurá-las e não o fazemos? Por que o filme que dispara nosso coração ou quase o faz parar não nos acorda e faz restabelecer contatos que o tempo empurra para tão longe?
A profissão de Jack é uma guerra diária, mas uma batalha muito mais nobre do que soldados lutando guerras. Jack é um bombeiro, enfrenta o caos de prédios desmoronando em chamas para salvar vidas. Jack é um herói e sua coragem e vida dramática no trabalho, junto da sua família maravilhosa e amigos do peito tão fiéis vão nos envolvendo como se o conhecêssemos. Como se fosse um amigo. Como se fosse uma daquelas pessoas tão boas que um dia foram tão presentes ou nos ajudaram ou ensinaram em breves momentos eternos.
Jack parece ainda mais real porque atrás dele está um dos atores mais viscerais – emoções explodindo em seus olhos que dizem tanto – que o cinema já teve, Joaquim Phoenix; ele mesmo, o gigante em humanidade que já nos deu a poderosa cinebiografia de Johnny Cash.
Jack tanta engolir a dor e o medo ao ver um companheiro de trabalho mais que ferido; ou ao perceber o misto de pavor e admiração da esposa por seu trabalho tão arriscado.
Jack é um herói.
Jack é todo aquele que em algum momento se preocupou com a gente e estendeu a mão no meio dos incêndios recorrentes que temos que apagar nesse grande prédio chamado vida. Um edifício que vamos construindo sem nunca acabar como se fosse a catedral inacabada de Gaudí em Barcelona. A catedral que o gênio espanhol batizou de Sagrada Família.
Sagrada Família que é você, você e você, e tantos outros e outras, meus amigos, minhas musas e amadas que um dia significaram tanto.
Graças que filmes simples, mas marcantes como a Brigada 49, nos lembram que o significado persiste.
Persiste dentro da gente como o bombeiro que, assimilada a tragédia, vai de novo entrar num prédio em chamas. Porque há sempre alguém a salvar.
Um alguém que pode ser nós mesmos.

Lembrem que bombeiros trabalham num coletivo, numa Companhia chamada Brigada. Uma briga de companheiros que trabalham juntos pela vida.
Mas esse “juntos” só pode valer se as pessoas distantes lembrarem como é bom um reencontro.
Quem quiser erguer um brinde à vida, ao passado e ao futuro que tenha a beleza de tentar rever os seres especiais que um dia passaram por vocês.
Rever de verdade, olho no olho, abraços mais abraços, mãos apertadas e palavras trocadas. Podem começar com um simples mas poderoso telefonema.
Façam isso enquanto o mundo não vira um grande emaranhado de meras mensagens, scraps, virtuais.
O virtual não permanece.

* Dedico esse texto ao jovem Henrique, um ex-aluno brincalhão que a gente achava meio maluco. Um dia ele virou pai. Um dia ele amadureceu. Um dia ele me reencontrou, no pouco tempo em que tem para voltar ao Brasil, e me disse como nossas aulas foram importantes. Henrique sempre foi daqueles caras transparentes e bom coração. Talvez por isso ele hoje esteja trabalhando como bombeiro.  

  

Um comentário:

  1. Aprendi com você a enxergar o melhor, o mais precioso e bonito que existe em cada pessoa. Aprendi a não julgar ninguém por um rótulo, título ou simples embalagem. E aprendi que sentimentos só valem a pena quando são compartilhados.

    Mas, sabe, Zé, é tão difícil quebrar barreiras e alcançar alguém. Às vezes eu tento, me jogo. Ofereço meu melhor - sem medo de parecer romântica ou "rosa" demais - e espero sempre um olhar em troca. Mas não é tão fácil encontrar quem nos olhe de volta.

    Sei lá, acho que sentir, tocar alguém está meio fora de moda.

    Já reparou que as pessoas estão sempre prontas para atacar, desferindo palavras ríspidas, duras e implacáveis/definitivas? Mas na hora de oferecer um abraço ou um consolo são raros os que ainda estão por perto...

    É por isso que, às vezes, eu prefiro não me envolver com nada nem com ninguém. Não se trata de frieza ou insensibilidade. É só uma escolha confortável, uma máscara de proteção.

    Prefiro oferecer ajuda SÓ e SE alguém precisar. E pedir. Será que isso é ser egoísta demais?

    É que é difícil entrar num prédio em chamas, estender a mão para "salvar" alguém e perceber que o seu esforço foi inútil. Só podemos salvar quem estiver disposto a ser salvo.

    E, por mais que sejamos capazes de "traduzir" pessoas, é sempre mais fácil olhar de longe. Admirando as conquistas. Lamentando as tragédias. E torcendo para que tudo se acerte...

    Nunca vi esse filme. Mas, com certeza é mais um daqueles essenciais. Vou tentar alugar esse fim de semana.

    Saudade de vc, querido.
    Um beijo.

    ResponderExcluir