quarta-feira, julho 20, 2011

A crise moral do esporte brasileiro

A vergonhosa participação da seleção brasileira na Copa América passa, muito, pela crise moral que o futebol e várias modalidades atravessam no Brasil. A crise começa no visual, com muito jogador se preocupando demais com o corte novo no cabelinho, a roupinha descolada e até o headphone mais vistoso e potente. Há também muita brincadeirinha, tiração de sarro e trotes bobos na seleção. Coisa normal, da “alegria” do jogador brasileiro? Ontem o goleiro Julio César revelou que temia pelo desempenho brasileiro nos pênaltis porque ele sabia do fraco aproveitamento nas cobranças dos seus companheiros nos treinos. Treinos de pênaltis que eram mais brincadeiras do que ensaios sérios. Treinos que Mano Menezes nem acompanhava.
O visual é um elemento banal, menor, mas já demonstra uma excessiva vaidade individual. Que Neymar use aquele moicano ridículo, vá lá porque ele se garantiu no Santos ganhando tudo assim (não na seleção...). Quando Daniel Alves imitou o penteado, deu no que deu...
Pior é a falta de uma equipe e espírito de grupo, claríssima na seleção do grupo dos veteranos liderados por Lúcio e no dos moleques, liderados por Neymar e apadrinhados pelo veterano que nunca amadureceu, Robinho. Mas não me venham falar no grupo unido do Dunga, porque grupo unido em torno de uma ideia e estilo imbecil (o tal futebol guerreiro que resultou em aberrações como Felipe Mello), não vale.
Cada vez mais nítida também a postura blasé, fria, com que os jogadores vestem a camisa da seleção. Em campo, a postura blasé vira aliada do individualismo de quererem decidir os jogos sozinhos. E voltando a respeito, eles só demonstram isso por quem lhes pagam fortunas, os seus clubes. Uhn, respeito em termos, porque é um tal de jogador quebrar contrato e fazer chantagem pra ser liberado para outros clubes... Grande parte dos jogadores de ponta brasileiros só pensam em grana, em salários maiores. Mesmo um ídolo amado de uma torcida, Kléber, anda fazendo de tudo para ir para o Flamengo. Amor da torcida? Ele não tá nem aí pra vocês, palmeirenses.
Claro que a culpa não é só dos jogadores. Há também os empresários inescrupulosos que assediam e compram os direitos dos atletas desde que são garotos. Há os dirigentes dos clubes, que não estão nem aí em acompanhar os estudos dos meninos das categorias de base. Todos só querem faturar em cima dos garotos. E não estão nem aí quando 99% deles não dão certo na bola e, como não estudaram, vão se ferrar na vida.
Há também a culpa da mídia, que exalta qualquer um com um pouquinho mais de talento, massageando o ego vazio de nossos jogadores sem a mínima formação educacional e moral.
O mais triste é que o problema não fica só no futebol. O descaso com a formação dos atletas como homens existe até no “tão organizado” vôlei, em que os melhores do país passam longas temporadas concentrados no CT de Saquarema, e a escola que se dane.
E esse desrespeito acontece em várias modalidades. Tenho um grande aluno, cabeça boa, sério, dedicado, grande coração, que simplesmente quase não esteve em sala de aula no primeiro semestre inteiro. Ou estava concentrado com a seleção, em outra cidade, ou estava disputando competições no exterior. Óbvio que os dirigentes do seu esporte não está nem aí para a formação dele num ano-chave, o último do colegial, às portas do vestibular e da escolha de uma carreira. Só querem saber das conquistas do garoto, que vem trazendo grandes resultados ao país. Planejamento da Confederação e organização para respeitar o período letivo do garoto? Zero. Qual o preço que o menino pagará, no futuro, por seu empenho no esporte?
Basquete? Talvez o caso mais claro de falta de respeito com seu país. Os mais badalados atletas brasileiros simplesmente se recusam, seguidamente, a vestirem a camisa da seleção, como fazem Leandrinho e Nenê. E ainda dão desculpas esfarrapadas para não defenderem o Brasil. Gozado que o MVP das finais da NBA, onde os brasileiros jogam (pouco, são reservas de luxo...), o alemão Dirk Nowitiki, nunca deixou de atender a uma convocação da seleção alemã. E disse uma vez que, se for preciso, ele mesmo pagaria o seguro exigido por seu clube na NBA.
Mais da crise moral? Mesmo os diferenciados jogadores de vôlei da seleção, dos quais realmente podemos sentir a paixão e orgulho com que defendem a amarelinha, mancharam suas carreiras belíssimas com aquela vergonhosa partida entregada ordenada por Bernardinho no Mundial do ano passado.
Natação? Sim, Cielo está ainda se defendendo da acusação de doping na China, mas o fato é que, neste século, adivinhem qual o país que teve mais atletas flagrados no exame anti-doping de natação em todo o mundo? Sim, Brasil.
O mesmo doping que fez um verdadeiro arrastão em muitos grandes nomes do atletismo brasileiro no ano passado, incluindo um dos mais renomados treinadores de nossa história.
Até no vôlei de praia somos pêgos agora, como ocorreu com Pedro Sohlberg, flagrado por tomar esteróides. Imagino o desgosto de sua mãe, a grande Isabel, uma das mais valentes e íntegras atletas de nossa história, uma das responsáveis por o Brasil ser hoje uma potência no vôlei feminino.
Tudo isso para dizer que há um descaso muito grande na formação dos atletas brasileiros hoje que resulta em cabeças vazias e individualistas e um vale tudo por resultados (doping, entregadas etc).
Como resolver isso? O pequeno e vizinho Uruguai dá a receita, com seu belíssimo projeto implantado por Oscar Tabarez no futebol, em que os jogadores das seleções de base estudam e são acompanhados por profissionais de várias áreas. Os frutos estão aí, com a Celeste brilhando na equipe adulta e no sub-17 (vice-mundial) e sub-20.
O problema é que basta olhar para o presidente do órgão esportivo mais poderoso do país, Ricardo Teixeira e sua CBF (sua porque ele faz dela o que bem entende) para imaginar ele refletindo sobre a formação do jogador brasileiro. Com sua linguagem chula típica (leiam a chocante, debochada e nojenta entrevista dele na revista Piauí deste mês) ele deve pensar, “que se f...”.
Pensando nas outras modalidades, o poderoso Nuzman e seu milionário Comitê Olímpico Brasileiro (sim, seu...) só trabalha pelo esporte de alto rendimento. Joga a responsabilidade do trabalho de base para o governo e para os clubes (como, se estes, com raras exceções como um Pinheiros, um Minas Tênis, só pensam no futebol?).
O futuro é negro.
PS – A razão das fotos que ilustram esse post? Reparem no uniforme sóbrio, respeitoso e padrão dos uruguaios e pensem na seleção brasileira... Ah, e eles preferem a companhia de um mate (que compartilham) que de aparelhinhos, celulares etc. A outra foto é do jovem Denílson, que volta ao São Paulo depois de anos na Europa e não se dá o trabalho de tirar o bonezinho e o óculos-escuro para posar com a bandeira do clube.
Nunca vi Raí, maior jogador da história do São Paulo, de boné ou óculos-escuro.

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